Desde o anúncio oficial, o projeto da Netflix de fazer uma série em live-action de Cowboy Bebop foi envolto de muita desconfiança, especialmente após Death Note. Contudo, com os primeiros anúncios, como o elenco e a volta de Yoko Kanno na trilha sonora, foram me dando um pouco de esperança. Aí, o trailer saiu, e minha esperança virou hype. Tudo o que fora mostrado até então me lembrava muito o clássico anime, com seu clima de universo distópico, rodeado de jazz e blues, típico de filmes noir, junto com sua gama de personagens intrigantes e extremamente carismáticos. Ainda assim, aquela pulguinha atrás da orelha permaneceu.
Agora, 10 episódios depois, posso dizer que sim, Cowboy Bebop é uma boa adaptação, mesmo repleta de problemas que podem deixar qualquer fã do anime de cabelo em pé. De todo modo, a série conseguiu me cativar graças ao seu trio protagonista e seu clima, que me arremeteu muito ao material original, cujo qual dificilmente será superado, mas não era a intenção aqui. São muitos problemas? Não exatamente. Tirando um fator crucial que comentarei mais a frente, as outras questões com a produção não chegaram exatamente a me incomodar, mas novamente, para fã saudosista, talvez se torne algo complicado.
O trio perfeito
Logo de início, posso dizer sem sombra de dúvida que a melhor coisa da série é o seu trio principal. John Cho, Mustafa Shakir e Daniella Pineda possuem uma química em tela invejável, fazendo com que suas versões de Spike Spiegel, Jet Black e Faye Valentine sejam tão interessantes e carismáticas quanto suas contrapartes animadas. Em todas as cenas com os três, até mesmo nas que o humor meio pastelão não funcionam tão bem assim, eles conseguem virar a coisa ao seu favor, especialmente Shakir, de longe o meu favorito na produção.
Além de serem extremamente divertidos juntos, os três protagonistas conseguem carregar suas cenas nas costas quando estão isolados, especialmente John Cho, visto que a série em sua primeira temporada resolveu dar mais ênfase ao passado de Spike. Ainda assim, temos destaque o suficiente para as histórias de Jet e Faye, mas, assim como é o caso de Ed, último integrante da Bebop, suas trajetórias e desfechos acabam sendo deixados para possíveis novas temporadas. A ideia desse primeiro ano da adaptação é, além de, claro, homenagear o anime o máximo que puder, conseguir desenvolver o background do seu principal protagonista e vilão/rival. E aí vem o meu grande problema com o que a Netflix fez.
Não bastasse o erro com Vicious, sobrou pra Júlia.
Diferente dos mocinhos da trama, que tentam ao máximo serem fiéis ao material original, só com algumas mudanças aqui e alí que, honestamente, funcionam, como é o caso de Jet ter uma filha e viver um dilema com seu relacionamento com ela, infelizmente os produtores da série acharam que seria uma boa ideia mudar totalmente as características de dois importantes personagens: Vicious e Júlia. Não, não é culpa dos atores Alex Hassell e Elena Satine, que fazem um bom trabalho com aquilo que lhes foi entregue. O problema aqui foi a decisão de roteiro de tentar aprofundar mais o passado e o relacionamento do triângulo amoroso da série.
Ao longo dos episódios, a produção explora um pouco mais do passado de Spike, Vicious e Júlia antes dos acontecimentos da trama, coisa que fica muito subentendida no anime. Esse ar de mistério e complexidade dava um pouco de carisma para os personagens na produção original, já aqui… A tentativa de dar uma razão para o vilão ser como é, e também dar um pouco mais de tempo de tela para Júlia, simplesmente não funciona. O antagonista me lembrou em muitas partes Kylo Ren, vilão da última trilogia de Star Wars. Funciona quando está longe do seu núcleo, sendo um personagem que chega ao “aceitável”, mas quando começam a explorar seu passado… Ele vira um bebê chorão. Já Júlia… muitos que não viram o anime podem dizer que faz sentido o que é proposto, mas em nenhum momento parece que a jornada da personagem se conecta. É um momento ela aparenta desejar X, depois Y, e ao final da temporada, ela dá um triplo mortal carpado e quer W.
A todo momento em que via as decisões feitas com esses dois, especialmente nos últimos episódios, parecia uma tentativa clara da Netflix de esticara história o máximo possível. Afinal, estamos falando de um anime com apenas 26 episódios, e lógico que querem que a série tenha mais do que apenas uma temporada. Com essas decisões, toda a trama envolvendo o triângulo amoroso foi alterada, e eu não faço ideia se existe a possibilidade de vermos algo semelhante ao anime nesse quesito.
Confia. Foca na parte boa que dá certo.
Tirando as decisões envolvendo os outros personagens além do trio protagonista, e o fato do humor meio pastelão não funcionar a todo momento, Cowboy Bebop consegue ser extremamente competente no quesito de adaptação. Durante todos os 10 episódios eu me senti vendo Cowboy Bebop, uma versão um tanto diferente de um dos animes mais legais que já assisti, mas ainda assim era o que eu me lembrava. Creio que, não fosse a necessidade de esticar mais do que deveria, a produção teria mais espaço para brilhar igual ao seu material fonte.
No fim das contas, Cowboy Bebop é sim um bom divertimento. Seu trio principal é cativante e carismático, as homenagens ao anime não são apenas fan-service na maioria do tempo, e a trama se desenvolve bem o suficiente, mesmo que um anime com episódios de 20 minutos tenha sido esticado para 1 hora cada episódio. Tem problema? Tem. Fãs vão odiar? Vão. Mas, se conseguir focar na parte boa e tentar pensar nas possibilidades pro futuro, dá pra curtir. Ah, e ainda tem o Ein extremamente fofo quando aparece.