Honestamente? Estamos cheios de aventuras memoráveis na ficção, seja um mundo mágico, um guarda-roupas que te leva à uma nova leitura e até mesmo batalhas contra um império maligno, mas sem dúvidas, há algo que me chamou atenção e que não há nada que me prenda mais que o absurdo: O Guia do Mochileiro das Galáxias.
O principal ingrediente da trilogia de cinco livros, que originalmente era um programa de rádio da BBC, é o absurdo unido ao inesperado e o humor inteligente. Se engana quem pensa que a dinâmica do absurdo e bizarro é algo fácil de se executar e que são apenas enredos jogados e cruzados uns com os outros, sem compromisso, exceto o de fazer sentido na cabeça do autor. Não é. Ao menos não aqui, não neste livro. Por que? Porque Douglas Adams é um gênio.
O livro começa nos apresentando Arthur Dent, um homem simples e pacato que está prestes a ter sua casa demolida e então ele resolver ficar deitado em frente à ela para evitar que os tratores avancem, porém seu protesto é impedido por Ford Prefect, seu amigo de longa data. Mas não tem problema o protesto de Dent ter sido interrompido, sua casa não seria a única propriedade a ser demolida.
O primeiro capítulo se concentra no irreversível, incontestável e incontrolável fato de que a Terra será destruída por uma frota de Vogons, seres mal-educados e péssimos em poesia. É aqui que eu fui pego, é um jeito animado de iniciar algo, mostre a agitação da coisa Sr. Adams! E seria algo bem clichê a Terra estar sendo ameaçada pela destruição iminente e tivesse de lidar com o fato, mas o diferencial é que a Terra realmente é destruída.
Daí para frente, somos conduzidos por um tour ao redor do universo, onde temos a introdução de conceitos de explodir a cabeça, porque bem, essa parece ser a finalidade do livro.
Uma aventura cosmo-filosófica em torno do que realmente faz sentido, do que realmente importa e do que realmente você trata como verdade absoluta. Há a possibilidade de você se pegar em um desses trechos como o do jardim do Éden, onde Deus é visto como alguém que quer apenas pregar uma peça colocando uma árvore no meio do jardim e dizendo para ninguém comer um fruto sequer dela, apenas para que alguém pudesse comer e ele ficar feliz ao gritar “Peguei vocês, peguei vocês!”, audacioso para um britânico, quem mora na Terra do “Deus salve a rainha”, porém necessário.
Necessário? Veja bem, há uma diferença muito grande entre zombar de um ser no qual muitas pessoas acreditam e dedicam suas vidas e propor uma reflexão. Quero dizer, as coisas realmente deveriam ser interpretadas dessa forma? Há um erro muito grande em toda a história? Isso está inserido em um contexto correto? Há bem mais em um punhado de palavras do que podemos observar. É um jogo de interpretação, uma questão de visão. Aliás, já dizia o senhor Raul Seixas que quem não tem, dá de cara com o muro e isso é bem verdade, ao menos nesse caso eu posso garantir.
Seria um erro rude subestimar essa obra e reduzi-la a algo infantil. Não durmam no ponto, crianças. Leiam com disposição, se o fizer, terá uma experiência mágica e não há outra melhor para defini-la.
Não seria exagero usar a palavra mágico para definir O Guia do Mochileiro das Galáxias, na verdade, me incomoda que não tenham criado uma palavra tipo “Zapagun” para defini-lo. Um daqueles apelidos íntimos que você dá a(o) que(m) você gosta de verdade e, poxa vida, eu amo esse livro.
Se ele fosse uma garota, eu namoraria com tranquilidade. Nomes incríveis é o que não falta aqui e eu me curvo à genialidade do autor. São inúmeras situações as quais você se pergunta: o que este cara comeu para pensar nisso? Algo que o deixou de bem com a vida, com certeza.
Eu acredito veementemente na supremacia desse livro como grande influenciador da cultura pop. O próprio dia do orgulho nerd é uma referência ao dia da toalha que, INFELIZMENTE, divide sua importância com Star Wars.
O escritor de histórias em quadrinhos Brian Michael Bendis ama inserir referências ao número 42, que tem uma grande importância para a toda a série, em seus quadrinhos. Por exemplo, Bendis criou o Miles Morales, a aranha que pica o Miles carrega o número 42 em suas costas, o número de fugitivos da Balsa no primeiro arco de Novos Vingadores lá de 2005 também é 42.
Por favor não me julguem por reparar em todas essas coisas, é só que está escancarado ali. Não é como se eu fosse um psicopata-nérdico. Não me surpreende Douglas Adams ser tão influente, ele até chegou a escrever alguns episódios de Doctor Who.
O primeiro livro da série é completinho e ficaria lindo na primeira temporada de uma série. Curtinha, perfeitinha. Altas expectativas por aqui. Esse é um dos diferenciais do livro. Ele não deixa brechas para o próximo, você não é obrigado a ler, enrole o quanto quiser, apenas se divirta, mas eu aposto que você não irá conseguir se segurar.
E se o primeiro consegue ser mágico, o segundo é deslumbrante. Sabe, cheio de pompa, carisma e tudo mais. Eu diria que o Restaurante no Fim do Universo é uma grande orquestra que não para de tocar enquanto o livro não termina. Eu arrisco dizer que você conseguirá escutar o concerto durante um bom tempo depois que terminar a leitura.
Se antes nós tínhamos um humor rico e um enredo divertido, aqui temos um humor excepcional e um enredo épico. É incrível o quão fácil você se perde e se encontra tanto quanto os personagens e não, isso não é ruim. Na verdade, significa que você captou o espirito da coisa. Claro que há alguns momentos monótonos, não seria um livro se não houvesse, mas é necessário diante de todas as coisas. Tenha cuidado para não esquecer o ponto chave por causa das distrações.
A capacidade desse livro de mexer com a sua imaginação é de outro mundo, literalmente. Acredito que acompanhado de uma boa trilha sonora, um assento confortável e um pouco de concentração, você conseguirá ver o que está acontecendo, mesmo sejam apenas palavras. Vale o esforço, caso você não tenha o costume de ler.
Outra grande vantagem da série é o fato de não serem livros gigantes, cada um varia entre 70 e 100 páginas, o que não torna a leitura chata ou cansativa.
Eu queria dedicar um parágrafo para pontos negativos, mas não consigo imaginar algo ruim aqui. Será que a minha paixão por essa obra está me cegando e me impedindo de ver os seus defeitos, de modo que eu idealize a sua perfeição em minha mente? Não, acho que ele é perfeito mesmo.
Além dos livros, O Guia do Mochileiro das Galáxias já foi lançado em uma série de quadrinhos escrita pelo próprio Douglas Adams ao lado de John Carnell e com a arte de Steve Fastner, Claude Goodwin e Rich Larson entre 1994 e 1995, houve também uma série na BBC em 1981 e já foi adaptado para as telonas em 2005, além de estar atualmente com uma série em produção pela Hulu.
Não temos nenhuma notícia da produção faz muito tempo, porém a série já foi renovada para uma segunda temporada, antes mesmo do lançamento da primeira. Fiquei curioso, é uma surpresa que mesmo sem um trailer ou fotos já tenhamos uma renovação. Curioso e feliz, esses são os sentimentos.
Em breve irei reservar um tempo para falar especialmente do terceiro livro da série, A Vida, o Universo e Tudo Mais. Mas por enquanto é só. Adeus e obrigado pelos peixes.