Estreando em 2004, Steel Ball Run (SBR) narra a história de uma longa corrida a cavalo que cruza os Estados Unidos da América.
SBR foi lançado como um mangá independente, apesar de gritantes semelhanças com JoJo’s Bizarre Adventures, mas não demorou muito a ser oficializado como a sétima parte da série famosa de Hirohiko Araki, porém ambientado em um universo diferente.
Steel Ball Run dá um salto em relação a todos os elementos que compõem as partes antecessoras, não que elas tenham sido deixados de lado, mas foram aprimoradas com tempo, na verdade, tempo é o maior aliado da obra, não no sentido de entrega de capítulos, mas sim em termos de qualidade, de modo que as características da obra sejam aprimoradas e encaixadas em seus devidos contextos de forma pontual. O tempo não fez apenas bem para o roteiro, mas como em toda continuação do mangá, já que a arte teve uma notável evolução, tanto na versão sem cores quanto na versão colorida.
Jonathan “Johnny” Joestar era um jóquei popular, até que perdeu os movimentos de suas pernas depois de levar um tiro. Julius “Gyro” Caesar Zeppeli era um carrasco do reino de Nápoles em busca de anistia para uma criança condenada à morte.
Quando Johnny toca nas bolas de aço (eu sei que você riu) que Gyro utiliza como munição para sua técnica chamada “spin” (refinada através das gerações da família dele), que é uma clara analogia ao “hamon” que os Zeppeli das partes anteriores utilizavam, ele sente suas pernas se mexerem por um curtíssimo período de tempo. Johnny então se junta a Gyro na SBR, na esperança de descobrir os segredos do spin e recuperar o movimento definitivo de suas pernas, enquanto Gyro pretender vencer a corrida para que seu rei conceda anistia ao garoto condenado. Dessa premissa nasce o que eu considero a maior relação de um Jojo com o seu Jojobro.
Por toda a saga JoJo’s Bizarre Aventures existem personagens que acompanham os protagonistas, ao qual carinhosamente chamamos de Jojobros. Entre esses personagens, há alguns que se destacam por estarem mais próximos que os outros, por exemplo: na primeira parte temos Speedwagon como Jojobro mais próximo de Jonathan Joestar, na segunda, Caesar Zeppeli de Joseph Joestar, na terceira, Kakyoin com Jotaro e assim por diante.
Todos esses personagens têm uma peculiaridade em comum que vocês descobrem com o passar na história, principalmente quando estamos nos aproximando do fim da história. Em SBR não seria diferente, dessa vez, Jojobro e Jojo estão mais próximos do que nunca, eu diria que essa relação é o melhor de toda a história. Johnny e Gyro passam o tempo todo juntos devido a expectativa de vencerem a corrida um seguido do outro, inclusive descansam no mesmo lugar.
Claro que essa proximidade não é uma exclusividade dessa parte, mas aqui ela evoluiu, alcançando um nível único e confortante de irmandade. Tem muito mais do que companheirismo envolvido, tem muito amor aqui, Araki reproduziu isso tão bem que chega a ser único. Há uma proximidade entre os dois que eu não consigo usar uma palavra para definir além de química, não necessariamente química romântica, mas de certa forma, Johnny e Gyro complementam a existência um do outro, como arroz e feijão.
Acredito que encarar dessa forma não seria uma dificuldade nem mesmo para pessoas pouco perceptivas, já que Araki escancara e desenvolve isso não apenas com as palavras, mas também com painéis e certas mudanças na forma de desenhar, como um olhar mais aguçado, um cuidado em desenhá-lo, como se quisesse dizer algo, seguido de atos de ambas as partes que demonstram disposição ao sacrifício pelo outro. É lindo.
No que diz respeito a enredo, SBR possui um grau menor de bizarrices uma vez que a trama se desenrola principalmente em torno da adição da busca pelas partes do cadáver de uma figura bíblica que há muito tempo peregrinou pela América antes dos colonizadores, durante o trajeto da corrida, trazendo uma centralização da trama que evita distrações maiores. Esse cadáver santo concede habilidades Stand e esse é o pretexto para as lutas emocionantes que sempre são decididas nos detalhes e com bom planejamento como de costume.
Se antes tínhamos gritos exagerados e saltos escandalosos, agora temos discussões filosóficas e física durante as lutas, o próprio vilão Funny Valentine possui um alto senso patriótico em seu peito estufado e carrega um enorme peso nacionalista nas costas utilizado para justificar seus atos moralmente questionáveis.
Todos os personagens carregam consigo certezas sobre suas visões de mundo, é realmente uma maravilha ver essas visões se conflitarem e, no final, ver qual personagem vai prevalecer sobre o outro acompanhado de sua verdade, apenas acompanhado, já que dificilmente chegaremos à uma conclusão do quão certos estão.
A busca por um corpo santo constantemente da margem para a exploração de destino, pecado, certo e errado. Difícil é sintetizar esses conceitos e chegar numa verdade absoluta, talvez porque ela não exista e só nos reste torcer para o que parece mais justo, detalhe que justiça exige certos parâmetros que variam para cada pessoa, engraçado.
Hirohiko Araki está sempre se inspirando em moda e pinturas clássicas para aplicar em seus desenhos, designs de personagens e composição de cenários. Steel Ball Run, com quadros mais estáticos, parece ser desenhado, na maioria de suas páginas, com a intenção de construir a ideia de períodos ou acontecimentos históricos marcantes em forma de pintura. Como uma visita à uma exposição artística com roteiro pronto.
Araki costuma ter um avanço de uma parte para a outra de sua obra, mas em SBR ele parece ter uma evolução constante em seus capítulos, como se ele escolhesse as páginas que seriam marcantes e nos dissesse “fique de olho nisso, pois é um fato histórico dentro deste universo”.
Steel Ball Run dá um pontapé inicial não só na nova cronologia de JoJo’s Bizarre Adventures, como também no novo estilo narrativo de Hirohiko Araki, apresentado em Stone Ocean e aprimorado aqui. Elementos, arte e personagens, tudo reformulado em prol da construção de uma obra de arte moderna. Boa corrida aos leitores!