Me desculpem os intelectuais de gosto refinado que mesmo em suas leituras mais triviais buscam algo além de porrada fresca e parcialmente justificada, mas – caso o título em letras garrafais não tenha deixado claro – eu não consigo ver a beleza, transcendência, parábola ocultista ou algo que o valha em gibis popularizados como “mano, olha que gibi cabeça” ou os Senhores Milagres da semana, mês, ano, década ou século.
Essa deficiência pode (e deve) ser culpa das minhas próprias limitações em enxergar gênios em figuras como Grant Morrison, Mark Millar, Warren Ellis, Brian Bendis e uma ou outra estrelinha cadente da vez, que escreve sua cota de sucessos antes de ser tragada de vez pelo mundo das drogas, da sonegação de impostos ou das editoras alternativas, sendo essa última a mais assustadora.
Não que o que eles fazem seja ruim ou ofensivo. Para mim, na verdade, é o contrário. Esses “grandes gênios” das bandas desenhadas, com uma outra exceção, parecem ter vergonha do que fazem. Seus quadrinhos são como prisioneiros da própria mídia tentando desesperadamente escapar de um poço repleto de seus semelhantes.
Não é errado querer ser o diferentão da turma, vide Alan Moore e as trezentas espécies de ratos que provavelmente vivem nas barbas daquele ermitão que, por mais esquisito que seja, ama quadrinhos, mas a sensação que esses Morrisons da vida passam é a de que são bons demais para todo esse universo multicolorido do qual fazem parte por um infeliz acidente. E seus leitores, por associação, também o são.
Contudo, essa questão é muito velha. Vamos falar de algo melhor e mais recente: Venomized, a nova série semanal da Marvel. Continuando os trabalhos feitos em Venomverse, onde foi descoberta uma realidade de criaturas devoradoras de simbiontes, os Poisons (ou Peçonhentos, em tradução livre muito melhor do que qualquer tradução literal).
Na trama, os Peçonhentos chegam ao Universo Marvel que conhecemos e amamos decididos a infectar cada um dos heróis com um simbionte e então consumi-los. Eu sei o que você está pensando e sim, você está completamente certo: É MUITO DIVERTIDO.
O quadrinho em si passa pouca sensação de ameaça, pois sua própria posição cronológica nos eventos do Universo Marvel deixa claro que tudo vai ficar bem, e Cullen Bunn, o idealizador de toda essa trama extremamente venenosa, utiliza isso a seu favor, lançando mão de todos os personagens que pode e fazendo o artista Iban Coello quebrar a cabeça bolando todos os designs “venomizados” dos personagens.
Envolvente e dinâmica, Venomized não perde tempo, ocupando um espaço nas lojas americanas a cada semana de abril, mostrando a que veio com ação desenfreada do começo ao fim, ocupando talvez o espaço de mega evento que deveria ser da não-tão-envolvente Avengers: No Surrender, tão esticada que a falta de uma ou duas (ou três ou quatro) edições pouco afetaria a compreensão geral da leitura.
Cullen Bunn, em tempo, nunca foi chamado de gênio – por alguém são ou não-exagerado – e nem é um. Apesar dos prêmios e dos ótimos trabalhos, seu histórico parece manchado por obras como Deadpool mata o UM, Deadpool vs Carnificina, Carnificina Mínima e todos os seus outros trabalhos de qualidade aparentemente duvidosa envolvendo o Deadpool, algum simbionte ou ambos.
Mas, verdade seja dita, ele sabe entreter. Seu trabalho, ora com monstros gigantes, alienígenas ou loucuras desmedidas de proporções catastróficas, é um sopro de alívio num mercado que ultimamente tem tentado demais se levar a sério dentro das páginas, medindo suas qualidades por Hugos, Eisners, Harveys, etc.
É necessário falar sobre o relógio do fim do mundo ou sobre impérios secretos para exercitar a velocidade das nossas sinapses, mas, no fim do dia, precisamos mesmo é de um Cullen Bunn, duas bazucas gigantes repletas de simbiontes e um punhado de heróis aleatórios brigando entre si para sermos felizes. E eu não troco isso por nada nesse mercado louco de gibis.