O fim da segunda temporada de The Leftovers trouxe Kevin Garvey de volta à família, na cena em que todos estão reunidos, inclusive os filhos que ele deixou de ver durante tantos episódios. Pergunto-me se não foi esse o pedido que ele fez à Holly Wayne quando se encontraram no banheiro, no momento em que Wayne tinha poucos minutos de vida e lhe concedeu um pedido. A terceira temporada mais uma vez avança no tempo, não sem antes aparar algumas arestas das anteriores. Numa sociedade que quer seguir adiante com sua vida, os Remanescentes Culpados se tornaram cada vez mais intoleráveis, por não permitirem isso e estão ameaçados de extinção.
No núcleo dos personagens mais conhecidos, cada qual reage à sua maneira, dentro do que acredita, e geralmente essas crenças trazem seus reflexos à vida cotidiana. Fanatismo, ateísmo, exploração da fé, amor e perdão estão presentes como nas outras temporadas, porém o clima mudou. Sutilmente, mas mudou. O termômetro do espectador nesta terceira temporada, parece ser apenas o angustiado e potencialmente suicida Kevin, e percebemos tudo através dos olhos dele.
Se por um lado ele tem a companhia de pessoas que lhe são queridas, por outro, há sempre questões a administrar, e percebemos que todos parecem recuperados, exceto Kevin – mas de uma forma muito sutil, nada é o que parece ser. A série continua muito rica em imagens sugestivas e linguagem muda, quebrando vez ou outra a quarta parede, usando a trilha sonora. Ora as cenas esclarecem, ora impõem uma nova condição.
Nas duas primeiras temporadas, quem ficou, é sobra, e vive no que pensa ser um novo tipo de inferno onde tenta-se que manter a rotina anterior. Dessa vez, a sensação de abandono foi diminuindo, as pessoas começaram a reencontrar suas motivações. Mas ao mesmo tempo, fica cada vez mais claro que um acontecimento maior que todos eles se avoluma, e está previsto para desabar num futuro próximo, e Kevin parece ser o fio condutor de tudo – e embora as pessoas estejam muito ocupadas consigo mesmas, ouvindo suas crenças internas, todos perecem perceber isso.
Michael Murphy e o cunhado de Kevin, Matt Jamison tentam acender a fé de Kevin, usando até artifícios para seduzi-lo a crer em um Deus, que para Kevin, nunca existiu – o que fez dele sempre um estranho em meio à temática da série e um ‘fio condutor’ bastante relutante. O final do primeiro episódio da terceira e última temporada traz mais uma questão intrigante, em vez de explicar; expõe o espectador a mais perguntas, e que só juntando todas as próximas peças que ainda serão entregues, poderemos responder. Sem querer impor trocadilhos, muito menos os de mau gosto, a série continua arrebatadora, justamente por não ser óbvia. The Leftovers terá estreia simultânea neste domingo, 16 de Abril, às 22 horas.
Agradecimentos à Cecília Rivers pelo análise do primeiro episódio da terceira temporada.